Era menina simples, com olhar curioso e mãos inquietas.
Podia ficar um dia inteiro observando o trabalho de formigas cortadeiras. Não
conseguia ficar um minuto no mesmo lugar sem estar incomodada com a quietude do
lugar. Era ambígua, paradoxa, complexa.
Era moça viva, cheia de ideias na cabeça. Parecia
não caber em si, um mundo tão grande que carregava no peito. O mundo e tudo
dentro dele. Fazia questão do “tudo dentro dele”. Era importante, o recheio
sempre é a parte mais gostosa do bombom de chocolate, seus amigos concordavam
com ela.
Era senhora e teria o sorriso cansado, mas espírito
satisfeito. Aquela sensação boa de chegar em casa, tirar os sapatos, afundar no
sofá e apenas fechar os olhos se permitindo não pensar em nada. Quer dizer, em
quase nada. Nada era muito para ela, sempre paradoxa.
Era senhora e estaria rodeada de gente, rodeada de
lugares, rodeada de aromas, rodeada de sensações. Envolta por muito, a procura
de algo.
Era senhora e já não se importaria. As coisas
estariam fora do lugar, sem sinal da menina ou da moça. O barulho do relógio
ainda a incomodaria, mas, seria trabalhoso demais levantar, aproximar, desligar.
“Deixa pra lá, como está, assim, não tem mais jeito” – pensaria.
O branco do papel ofusca a vista no quarto que já
começa a ficar escuro. Parece uma bola de cristal reluzente. Como nem tudo que
parece é, melhor deixar escuro.
Bem escuro.
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